segunda-feira, 31 de maio de 2021

O último dos irmãos


Lançado há poucos anos, o Dia dos Irmãos começa a ser uma celebração social incontornável. É aí que as coisas realmente nascem: nos hábitos das pessoas e das famílias, nos costumes sociais; não nas proclamações políticas ou deliberações parlamentares. O Dia do Pai ou o Dia da Mãe, por exemplo, não têm rasto no Diário da República, nem, antes dele, no Diário do Governo. Existem, porque a sociedade se apoderou deles. Começando num só país ou comunicando-se cedo no plano internacional, são festas da sociedade civil, como dizemos.

A prova do sucesso desta ideia encontra-se no “Borda d’Água”, que, desde há uns anos, mostra, a cada 31 de Maio, o lugar certo do Dia dos Irmãos. Não é em nenhum Diário da República, mas no “Borda d’Água”, o jornal oficial dos usos e costumes populares, entre muitas outras informações úteis.

A iniciativa do Dia dos Irmãos foi afirmada e lançada, em 2014, a nível europeu, pela Confederação Europeia das Famílias Numerosas (ELFAC); e a APFN portuguesa (Associação Portuguesa das Famílias Numerosa) tem sido uma das principais dinamizadoras. Compreende-se: as famílias numerosas são aquelas que mais irmãos têm e, por conseguinte, são muito sensíveis à sua existência e à sua dinâmica.

Mas não é preciso ser família numerosa para se viver intensamente a realidade dos irmãos e irmãs. Nem eu (que muito defendo esta ideia), nem o meu irmão (fundador da APFN e da ELFAC) somos de famílias numerosas. Éramos apenas nós os dois. E tanto o nosso pai, como a nossa mãe tinham apenas um irmão também. O nosso quadro familiar mais próximo foi de dois irmãos apenas.

Tenho observado – e já tenho escrito – que tipicamente, além de outros factores, a experiência específica dos irmãos decorre muito do número de irmãos; de serem todos do mesmo sexo ou de sexos diferentes; do número dos de cada sexo; das diferenças de idades entre eles. As relações são sempre fortes e, com o avançar da idade, caminham para a proximidade crescente entre todos. Mas, em criança e jovem, a experiência e a dinâmica tendem a ser bastante diferentes, consoante aqueles factores. Além disso, as personalidades e os temperamentos não são iguais, o que também determina muita da vivência em que nos definimos e crescemos.

Odemira, Setembro 1955: eu e o meu irmão Fernando,
com os nossos pais, no terraço de todos os acontecimentos.

No caso do meu irmão Fernando, éramos dois rapazes, com um ano e meio de diferença – ele mais velho do que eu. Isso fez-nos muito próximos: realmente com fortíssima cumplicidade, como não existiria se fôssemos rapaz e rapariga ou tivéssemos uma grande diferença de idades. Dormimos sempre no mesmo quarto, desde que saí do berço; brincámos e estudámos aí; fizemos construções e invenções, juntos; bulhámos e fizemos as pazes; andámos nas mesmas escolas e liceus; estudámos os mesmos livros escolares; fizemos os mesmos exercícios; ajudámo-nos a resolver problemas; fomos confidentes um do outro e guardámos segredos um do outro; rezámos nas mesmas igrejas; lemos muitos dos mesmos livros e escritores; rimos e jogámos imenso; fizemos corridas de bicicleta; iniciámo-nos em conjunto na fotografia e no cinema amador; eu sei lá... De tal forma que, tendo morrido já há sete anos, ainda não sei bem se sinto imenso a sua falta (e sinto-a) ou se ele ainda está guardado nalgum bocado de mim, de onde nunca partiu, nem parte. Somos unha com carne.

Lisboa, Junho 1951: o meu pai, Fernando,
e o tio Gilberto, no dia do casamento dos meus pais.

Já o meu pai e o meu tio Gilberto faziam seis anos de diferença. Eram muito amigos, mas havia como que uma relação paternal do meu pai para com o meu tio. É natural: quando o meu tio Gilberto fez um ano, já o irmão Fernando tinha sete; quando um fez três, o outro estava nos dez; quando o meu pai fez 16, ainda o irmão tinha nove – um miúdo. Isto sou eu a imaginar. Nada vi dessa infância e adolescência muito felizes, passadas em Angola, nos anos ’20 e ‘30. Apenas o imagino a partir das histórias que ouvi contar ao meu pai, aos meus avós, ao meu tio. Mesmo nas brincadeiras mais estapafúrdias, há quase sempre, ali, um lado de mentor (o meu pai) e outro de aprendiz ou ajudante (o meu tio, seis anos mais novo). Talvez daí, aquilo que me pareceu ver sempre neles até ao fim: uma grande admiração do meu tio pelo meu pai; e do lado do meu pai, uma forte admiração também pelo meu tio (enérgico e corajoso militar), acompanhado de grande desvelo e carinho. Havia ali, marcadamente, um irmão mais velho; e havia também um irmão bem mais novo.

Lisboa, 1950: a minha mãe Maria Helena e o tio Zé.

Com a minha mãe Maria Helena e o meu tio Zé, a diferença era outra. Tinham idades próximas: um pouco mais de dois anos entre uma e outro. Mas eram rapariga e rapaz, com interesses muito distintos, educações diferentes e cada um com seus amigos. Nessa altura, anos ’20 e ’30, isso era bastante mais acentuado do que hoje ou nos meus anos ‘60. A minha mãe, a mais velha, creio que só teve amigas e sobretudo dentro da família: primas. O meu tio teve um caminho próximo dos nossos dias: cursou o liceu e foi, solto e livre, para a Universidade de Coimbra, onde se fez médico. Tinham amizade muito forte, mas não propriamente cumplicidade. Apesar da diferença de idades ser menor, parecia-me ver na minha mãe o mesmo desvelo e carinho pelo meu tio Zé, como no meu pai pelo irmão. Na minha mãe, um olhar maternal. E o meu tio olhava a minha mãe com uma admiração que, por vezes, parecia quase cerimoniosa, diante da sua serenidade, prudência e dedicação familiar. A minha mãe acabou por desenvolver doença grave, que perturbou muito a sua vida. O meu tio Zé, que gostava muito da minha mãe e era médico, parecia-me algo quebrado, depois das crises da irmã. Ele sabia. Sabia que ia vir mais a seguir. Entre as coisas mais difíceis com que lidamos na vida está, já se sabe, a nossa própria impotência. Também era assim connosco. Quantas vezes me senti vergado pela incompreensão de onde vinha aquele mal e a impotência de pôr boa a minha mãe.

Destes irmãos que me moldaram e são minha referência, foi, agora, em 13 de Maio, a altura de partir o meu Tio Zé, com 93 anos. Já tinha ido a minha mãe, depois o meu pai, mais tarde o meu tio Gilberto, há alguns anos o meu irmão, agora o meu tio médico. Do meu núcleo familiar mais directo, eis como fiquei o último dos irmãos. Cheguei à linha da frente.

Foram dias que, com a minha tia Isabel (santa e querida mulher) e os meus três primos, filhos de ambos, me fizeram rebobinar no espírito e na memória tantos momentos e marcas de vida. As cinzas do meu tio foram para o jazigo familiar em Odemira, onde estão também a minha mãe e os meus avós. Estivemos depois um pouco (a Conchita e eu, a minha tia e os meus primos) a conversar no terraço da casa que foi da minha avó e ficou para mim.

Em criança, íamos sempre a Odemira, uma semana por ano, no Verão. O meu tio era médico ali perto, em Garvão, onde os meus primos cresceram e entraram na escola primária. Nessa nossa semana alentejana, a família juntava-se toda uma ou duas vezes, naquela casa, naquele terraço, nesses verões. Tenho muitas memórias de brincadeiras e de joelhos esfolados no chão do terraço, então em cimento. Muitas bolas voaram para a Praça Sousa Prado, cá em baixo, ou para um terreno baldio, cavado, profundo, de um dos lados.

Garvão, 1956: nós e dois dos meus primos.
Da frente para trás: Zé, eu, Jaime e Fernando.

Nesse mesmo terraço, os meus primos, sabichões da vida do campo, deslumbraram-me com um mistério: as galinhas correm com a cabeça decepada. Num dia, em que a iríamos comer ao jantar, os meus primos convenceram a empregada a, depois de cortar a cabeça junto a um dos esgotos do terraço, a porem outra vez no chão. Disseram-me: "Queres ver, Zé Duarte? Queres ver?" E eu vi: a galinha lá foi, lesta pelo terraço abaixo, como se quisesse ir de volta para a capoeira, que ficava ao fundo. Se não tivesse visto, não acreditava. Eu teria oito anos e fiquei admirado como poucas vezes. Noutra ocasião, salvámos um gatinho que caíra ou se perdera naquele baldio profundo ao lado do terraço. Miava de solidão e desnorte. Montou-se uma operação familiar de socorro, manejada pelo tio Zé. A minha avó forneceu um pequeno cesto da arrecadação, que se atou a uma corda resistente e comprida. Todos debruçados na amurada do terraço, os cinco primos a fazer claque e os adultos a darem orientações e palpites, o meu tio manejou o cesto com mestria, o bichano acabou por entrar no elevador improvisado e lá subiu dentro do cesto, feito colo mecânico, até à salvação. Foi um triunfo formidável. Inesquecível.

O Duarte, meu primo mais novo,
ao colo do pai, o meu tio Zé.

Esses meus três primos (Jaime, Zé e Duarte), de quem sou muito amigo e eles meus, parecem-se muito na sua relação com o meu irmão e eu. O Jaime e o Zé ainda foram comigo para o CDS, quando era porta-voz e me ocupava da comunicação social: o Jaime fez-se muito bom jornalista, com larga carreira; o Zé ainda criou uma banda desenhada de sátira política e alguns cartoons, para a "Democracia 76", mas seguiu arquitectura competente, tirando melhor proveito do seu desenho. Os três têm estreita diferença de idades entre eles, como o Fernando e eu. Vejo-lhes o mesmo tipo de cumplicidade, que se mantém até hoje. Cresceram entre eles, como nós os dois. Cada um tem o seu modo, mas andaram sempre na mesma estrada, pelo mesmo lado e ao mesmo tempo. Unha com carne. Irmãos para a vida.

Mafra, 1958: nós e os primos filhos do tio Gilberto.
Da esquerda para a direita: Fernando, Pi, Carrucha, Gonçalo e eu.

Os outros meus três primos do tio Gilberto (Carrucha, Gonçalo e Pi), de quem sou muito amigo e eles meus, já são um quadro diferente. São duas raparigas e um rapaz; e a diferença de idades não é igual. São muito amigos, mas até pela vida do meu tio, nas comissões em África, os filhos não andaram sempre na mesma estrada – numa altura, por exemplo, a mais nova estava em Angola com os pais e os outros dois, por cá, nos respectivos colégios militares. São muito unidos e a vida fê-los ainda mais próximos, depois de a sua mãe (a tia Zé) ter morrido num acidente de automóvel e, mais tarde, aquando do exílio com o pai. Sólidos como rocha, seguros como cabo de aço.

Uma nota que aprendi entre todos, ao longo da vida, no mesmo quadro vivencial ou em quadros diferentes, foi a ternura e a confiança entre todos. Graças a Deus. Os meus anos ’60 foram marcados pela guerra do Ultramar. O meu tio Gilberto era militar e fez três comissões em Angola, admirado como o “Comando n.º 1”. Desde os meus 10 anos, ou um pouco antes, escrevia-lhe “aerogramas”, como se chamavam as cartas que mandávamos pelo correio militar. O meu tio gostava muito delas, o que me fazia muito orgulhoso. Era o meu herói privativo e qualquer opinião dele valia mais que Prémio Nobel. Essa correspondência durou até aos meus 15, 16 anos. Ele também respondia por “aerograma”, mas frequentemente tinha de pedir ajuda para ler – tinha letra dificílima. Com o meu tio Zé aconteceu parecido. A certa altura, foi mobilizado como médico e, contrariado, lá foi para o norte de Angola, para Maquela do Zombo e Bessa Monteiro. Esteve ainda noutros lugares. Gostavam muito dele, como pessoa e como médico. O meu tio Zé era, entre outras qualidades, o que se chama um tipo pachola. Também lhe escrevi “aerogramas”, embora o correio não tivesse a mesma intensidade. Sei que contribuiu para alimentar a estima e o afecto que sempre lhe conheci por mim. Ensinou-me segredos. Tivemos, todos juntos, grandes dias e serões de paródias, jogos, conversa e gargalhada, na Cova da Piedade, no Algarve e em Almada. Passeámos várias vezes no seu barco à vela, paixão que lhe crescera com minha mãe, em jovens, então num pequeno "Star" que os meus avós lhes haviam dado. A minha tia voltou-me a assegurá-lo, há duas semanas, quando morreu: “Sabes? Perdeste um grande amigo. O teu tio tinha muita amizade por ti.” Eu sei.

Estas minhas referências são pessoas de até ao fim do mundo, pessoas que sempre foram para mim porto seguro, zona de conforto. Pessoas até para depois do fim do mundo.

Agora, que cheguei à condição de último dos irmãos da minha linha para cima, olho no mesmo patamar para os meus primos de ambos os lados, olho para o patamar de baixo dos meus filhos e sobrinhos e, já para o patamar seguinte, de netos  e sobrinhos-netos. É uma multidão de gente. Não sou o último. Ainda na minha linha e, a seguir, dela para baixo, há muitos outros. 

Grande tribo que me conforta. Aponta estrada muito para lá e para depois de tudo o que posso ver ou imaginar. Sinto-me bem e confortado, mesmo quando há problemas. No fundo, é uma cascata de irmãos, assim como as grandiosas quedas de Calandula (as do Duque de Bragança), com várias frentes e outros tantos desdobramentos. Uma cascata de irmãos, na verdade.

José Ribeiro e Castro

quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Em defesa das liberdades de educação



Em defesa das liberdades de educação

ASSINAR A PETIÇÃO



— Considerando que a Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece expressamente que «Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos» (art. 26.º);

— Considerando que o Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais especifica que «Os Estados […] comprometem-se a respeitar a liberdade dos pais» […] e a «assegurar a educação religiosa e moral dos seus filhos em conformidade com as suas próprias convicções» (art. 13.º);

— Considerando que, no Protocolo Adicional n.º 1 à Convenção de Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, os membros do Conselho da Europa convieram em que «O Estado, no exercício das suas funções, que tem de assumir no campo da educação e do ensino, respeitará o direito dos pais a assegurarem aquela educação e ensino consoante as suas convicções religiosas e filosóficas (art. 2.º);

— Considerando que a Convenção Internacional sobre os direitos da criança estabelece que «a criança tem o direito de conhecer os seus pais e de ser educada por eles» (art. 7.º);

— Considerando que a Constituição da República Portuguesa garante «a liberdade de aprender e ensinar» como direitos da pessoa humana incluídos no Capítulo dedicado aos «Direitos, Liberdades e Garantias» pessoais (art. 43.º);

— Considerando que a Constituição declara que «Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas» (art. 18.º);

— Considerando que a Constituição garante expressamente que «Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos (art. 36.º);

— Considerando que a Constituição declara que «Os pais e as mães têm direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos, nomeadamente quanto à sua educação […]» (art. 68.º);

— Considerando que, em correspondência a este direito insubstituível dos pais e mães à protecção do Estado, a Constituição estabelece que: «Incumbe, designadamente, ao Estado […] «Cooperar com os pais na educação dos filhos» (ar. 67.º);

— Considerando que a Constituição portuguesa proíbe o Estado de «programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas» (art. 43.º);

— Considerando que esta proibição constitucional do art. 43.º proveio do projecto de Constituição do PS, e foi defendida na Assembleia Constituinte pelo Deputado Mário Sottomayor Cardia, em nome do PS, por estas palavras: «Este artigo é contra a unicidade cultural e intelectual. É a recusa da filosofia, da estética oficial, da ideologia oficial e da religião oficial. Do mesmo modo, é a recusa do controle político do conteúdo da cultura e da educação. Na verdade, nós, socialistas, não queremos filosofia única nem estética única, nem política única, nem religião única, nem ideologia única». «Nós somos contra a unicidade em matéria de cultura e educação. Nós somos contra essa unicidade, porque entendemos que essa recusa é uma importante salvaguarda contra o totalitarismo»;

— Considerando que a Lei de Bases do Sistema Educativo distingue entre, por um lado, a acção educativa, e, por outro lado, estruturas e complementos e apoios educativos, e que é nas estruturas e complementos ao serviço da acção educativa que inclui a rede escolar, o financiamento e a acção social da educação, a cargo Estado, e não encarrega o Estado da acção educativa (art. 1.º e caps. III ss.);

— Considerando que a Constituição declara que «É garantido o direito à objecção de consciência, nos termos da lei» (art. 41.º);

— Considerando que a Lei de Bases do Sistema Educativo garante a objecção de consciência na matéria da actual disciplina de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento, quando estabelece que: «São objectivos do ensino básico […] n) Proporcionar, em liberdade de consciência, a aquisição de noções de educação cívica e moral» (art. 7.º);

— Considerando que, no recente caso publicamente noticiado e comentado, Artur Mesquita Guimarães e sua Mulher, pai e mãe de dois filhos alunos da escola pública de Famalicão, oportuna e repetidamente comunicaram às autoridades escolares a sua objecção de consciência quanto à frequência daquela disciplina pelos seus filhos;

— Considerando os termos públicos em que superiores autoridades governamentais e escolares têm recusado atender a esta objecção de consciência, alegando que a disciplina de educação para a cidadania é obrigatória, não sendo diferente «nem de Matemática, nem de História nem de Educação Física»;

— Considerando que esta interpretação se opõe à distinção que a própria Lei de Bases expressamente estabeleceu, quando só para a educação cívica e moral (e não para a Matemática, a História e a Educação Física) a Lei afirmou a pertinência da objecção de consciência;

— Considerando que uma juíza de direito já concedeu aos referidos pais uma providência cautelar contra a decisão do Ministério da Educação que manda anular a passagem de ano daqueles alunos nos dois últimos anos escolares, por não terem frequentado a disciplina de Educação para a Cidadania;

— Considerando, por fim, os princípios fundamentais da Constituição, designadamente: a dignidade da pessoa humana» (art. 1.º); os direitos à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade» (art. 26.º); a inviolabilidade da liberdade consciência (art. 41.º); o princípio da subsidiariedade do Estado (art. 6.º); e que «O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas» (art. 43.º);


Os cidadãos, abaixo assinados, vêm declarar publicamente, e em especial perante as autoridades do Estado,

— que consideram imperativo que as políticas públicas de educação, em Portugal, respeitem sempre escrupulosamente, neste caso e em todos os demais casos análogos, a prioridade do direito e do dever das mães e pais de escolherem «o género de educação a dar aos seus filhos», como diz, expressamente por estas palavras, a Declaração Universal dos Direitos Humanos;

— e, em especial e de acordo com a Lei de Bases do Sistema Educativo português, respeitem a objecção de consciência das mães e pais quanto à frequência da disciplina de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento, cujos conteúdos, aliás de facto muito densificados do ponto de vista das liberdades de educação em matéria cívica e moral, não podem ser impostos à liberdade de consciência.


Adriano Moreira (Professor de Direito e ex-Director ISCSP; ex-Presidente do CDS)

Afonso Braga da Cruz (Administrador de Empresa)

Alberto de Castro (Professor de Economia da UCP Porto)

Alexandre Patrício Gouveia (Gestor de Empresa)

Amândio de Azevedo (ex-constituinte e deputado; ex-Embaixador da UE)

Ana Cid Gonçalves (Associação Portuguesa de Famílias Numerosas)

André Azevedo Alves (Professor do IEP Universidade Católica)

Aníbal Cavaco Silva (ex-Primeiro Ministro e ex-Presidente da República)

António Araújo (Jurista, Doutor em História, assessor do Presidente da República)

António Bagão Félix (ex-Ministro das Finanças)

António Barreiro (Licenciado em Ciência Política)

António José Sarmento (Director de Colégio Escolar)

D. António Moiteiro, Bispo de Aveiro

António Pinheiro Torres (Advogado; ex-Deputado)

António Santos Castro (Médico)

António Vinagre Alfaiate (Empresário)

António Ulisses Cortez (Professor de Direito da UCP)

Bartolomeu Costa Cabral (Lugar-Tenente da Ordem do Santo Sepulcro em Portugal)

Carlos Aguiar Gomes (Presidente da Associação Famílias)

Carlos Alves (Professor de Economia da Universidade do Porto)

David Justino (ex-Ministro da Educação; ex-Presidente do CNE)

D. Duarte de Bragança

Diogo Costa Gonçalves (Professor de Direito Universidade de Lisboa)

Eduardo Oliveira e Sousa (Presidente da CAP)

Fátima Fonseca (Professora do Ensino Secundário)

Fernando Adão da Fonseca (Presidente do Forum para a Liberdade da Educação)

Francisco Carvalho Guerra (ex-Vice-Reitor da Universidade do Porto; Universidade Católica-Porto)

Francisco Vanzeller (Empresário)

Fausto Quadros (Professor de Direito - Universidade Lisboa)

P. Gonçalo Portocarrero de Almada

Graça Franco (Rádio Renascença)

Guilherme Valente (Editor, Gradiva)

Gustavo Mesquita Guimarães (Gestor de Empresa)

Helena Matos (Investigadora e colunista; Observador)

Henrique Alexandre da Fonseca (Almirante)

Ilídio Pinho (Empresário, Presidente da Fundação)

Isabel Almeida e Brito (Directora de Colégio)

Isabel Folhadela de Oliveira (Administradora da Têxtil M. Gonçalves)

Isabel Jonet (Economista; Banco Alimentar contra a Fome)

João Borges de Assunção (Professor de Economia Universidade Católica)

João Carlos Espada (Director do Instituto Estudos Políticos da Universidade Católica)

João César das Neves (Professor de Economia - Universidade Católica)

João Luis Mota Campos (antigo Secretário de Estado da Justiça)

João Marques de Almeida (Observador)

João Muñoz (Colégio S. João de Brito)

Joaquim Azevedo (ex-Secretário de Estado da Educação)

Jorge Cotovio (Director de Colégio; Associação Escolas Católicas)

Jorge Pereira da Silva (Director da Faculdade de Direito - Universidade Católica)

Jorge Miranda (ex-constituinte; Professor emérito de Direito - Universidade Lisboa e UCP)

José Adriano Souto Moura (Procurador da República)

José Carlos Seabra Pereira (Professor da Faculdade Letras - Coimbra)

José Luis Ramos Pinheiro (Rádio Renascença)

José Manuel Cardoso da Costa (antigo Presidente do Tribunal Constitucional)

José Manuel Furtado (Director de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Guimarães)

José Manuel Moreira (Professor Catedrático emérito da Universidade Aveiro)

José Maria Dias Coelho (Arquitecto)

José Marinho Gomes (Professor)

José Miguel Júdice (Advogado)

José Miguel Sardica (Professor de História Universidade Católica)

José Ribeiro e Castro (Jurista; ex-Presidente CDS; ex-Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura)

José Pena do Amaral (Economista; Administrador do BPI)

Laurinda Alves (jornalista)

Luis Mira Amaral (antigo Ministro da Indústria)

Luis Palha da Silva (antigo Secretário de Estado Comércio)

Luis Penha e Costa (Jornalista)

Luis de Sousa de Macedo (antigo Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros)

Manuel Braga da Cruz (Professor de Sociologia Política - Universidade Católica)

Manuel Carneiro da Frada (Professor de Faculdade de Direito da Universidade Porto)

D. Manuel Clemente (Cardeal Patriarca de Lisboa)

Manuel Porto (Professor da Universidade de Coimbra; ex-Presidente Conselho Nacional Educação)

Manuel Vaz (Professor de Direito, Universidade Católica - Porto)

Manuela Ferreira Leite (Economista; ex-Ministra da Educação e das Finanças)

Maria do Carmo Seabra (Professor de Economia Universidade Nova; ex-Ministra da Educação)

Maria João Avilez (Jornalista)

Mário Pinto (Professor emérito, ISCTE e Universidade Católica)

Miguel Morgado (ex-deputado, Professor no IEP Universidade Católica)

Miguel Sampayo (Economista)

Nilza de Sena (Professora do ISCSP da Universidade de Lisboa)

Nuno Rogeiro (Professor Universitário; Comentador de Política)

Patrícia Fernandes (Professor de Universidade, UBI e Minho)

Paulo Adragão (Professor de Direito, Universidade Porto)

Paulo Tunhas

Pedro Barbas Homem (Reitor da Universidade Europeia)

Pedro Ferraz da Costa (Empresário)

Pedro Garcia Marques (Professor de Direito da UCP)

Pedro Lomba (Professor de Direito; Advogado)

Pedro Marques de Sousa (Gestor de Empresas)

Pedro Passos Coelho (Professor de ISCSP; ex-Primeiro Ministro)

Pedro Roseta (ex-Constituinte; ex-Embaixador UNESCO; ex-Ministro Cultura)

Pedro Sampaio Nunes (antigo Secretário de Estado da Ciência e Inovação)

Pedro Sena da Silva (Empresário)

Raquel Correia da Silva

Rita Lobo Xavier (Professor de Direito, Universidade Católica – Porto)

Rita Seabra Brito (Professor de IEP Universidade Católica)

Rodrigo Queirós e Melo (Associação de Estabelecimentos do Ensino Particular)

Roque da Cunha Ferreira (Médico, Doutorado em Gestão)

Rui de Moura Ramos (antigo Presidente do Tribunal Constitucional)

Rui Machete (Professor de Direito; ex-deputado; ex-Ministro Negócios Estrangeiros)

Rui Medeiros (Professor de Direito Universidade Católica)

Rui Vieira de Castro (Empresário)

Sérgio Sousa Pinto (Deputado)

Sofia Galvão (Advogada, antiga Secretária de Estado da Administração Pública)

Teresa Ferraz da Costa

Teresa Nogueira Pinto (Doutoranda Relações Internacionais)

Vasco de Mello (Presidente do Grupo José de Mello)

Vasco Rocha Vieira (General; último Governador de Macau)

Zita Seabra (Editora)

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Obrigado, cidadãos!

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José Ribeiro e Castro, saído hoje no jornal i.

É gratificante verificar que a petição tenha mobilizado não só milhares de cidadãos, mas, entre estes, figuras destacadas da sociedade portuguesa em diferentes setores de atividade.


Obrigado, cidadãos!
Deve estar quase a concluir-se o processo parlamentar da petição “Legislar o poder de os cidadãos escolherem e elegerem os seus Deputados”, por que 7.372 cidadãos (até esta altura) pedem à Assembleia da República que dê seguimento ao disposto na Constituição e nos permita, aos eleitores, que possamos escolher, nas eleições legislativas, não só o partido da nossa preferência, mas também o deputado que queremos.

É gratificante verificar que a petição tenha mobilizado não só milhares de cidadãos, mas, entre estes, figuras destacadas da sociedade portuguesa em diferentes sectores de actividade. É, na verdade, uma ampla e significativa frente cívica independente, que reclama dos legisladores aquilo que é nosso direito: democracia de qualidade conforme à Constituição, democracia de cidadania.

Como co-autor do projecto de lei de reforma eleitoral e primeiro subscritor pela APDQ e pela SEDES, a todos agradeço, nomeando os mais destacados que consegui identificar, por ordem inversa da assinatura (com indicação do seu número de ordem), e pedindo desculpa a todos os outros por não os nomear também:
Teresa da Fonseca Gonçalves, 7216, bióloga e professora universitária

Nuno Amado, 7181, presidente do Millennium BCP

José de Almeida Serra, 7175, político, ex-ministro do Mar

Cristóvão Norte, 7161, economista e jurista, deputado

Luís Aguiar-Conraria, 7129, economista, professor universitário e cronista

Alexandre Patrício Gouveia, 7115, economista e gestor

Jorge Moita Vieira, 6939, estudante e coautor do projeto de lei de reforma eleitoral

António-Pedro Vasconcelos, 6811, cineasta

José Manuel Martins Lopes, 6769, filósofo, professor universitário, diretor da Faculdade de Filosofia de Braga

José de Paiva Boléo-Tomé, 6726, médico, professor universitário, publicista e ensaísta

Alexandre José Linhares Furtado, 6725, médico, cirurgião, Prémio Nacional da Saúde 2011

António Sevinate Pinto, 6667, perito em sementes, dirigente associativo e gestor no setor agrícola

Jacinto Monteiro, 6666, médico e professor universitário

Eduardo Oliveira e Sousa, 6657, engenheiro agrónomo, presidente da CAP

Roberto Carneiro, 6487, professor universitário, ex-ministro da Educação

Isabel de Bragança, 6441, princesa real e duquesa de Bragança

Miguel Frasquilho, 6420, economista, ex-deputado, presidente da TAP

Francisco Fernandes do Vale, 6400, médico, professor universitário

Carlos Seruca Salgado, 6369, vice-presidente da ANAC

Manuel Barroso Silvério Marques, 6353, médico, ex-ministro da Ciência e Tecnologia, ex-membro do CNECV

General Aurélio Aleixo Corbal, 6302, oficial da Força Aérea, ex-CEMFA

Manuel de Almeida Ribeiro, 6263, jurista, professor universitário

Luísa Antas, 6257, mestra em Direito por Harvard, administradora do Banco Finantia

João Marques Vidal, 6098, procurador-geral adjunto

Manuel de Almeida Damásio, 5593, presidente do Grupo Lusófona

Conceição Pedroso de Lima, 5581, professora catedrática de Ciências da Vida

António Pinto Basto, 5547, fadista

Eduardo Catroga, 5512, professor universitário, gestor, ex-ministro das Finanças

Rui Moura Ramos, 5453, professor universitário, ex-presidente do Tribunal Constitucional

Luís Filipe Rocha, 5300, cineasta

Margarida Corrêa de Aguiar, 5297, economista, presidente da Cidadania Social, ex-secretária de Estado da Segurança Social

General Garcia Leandro, 5272, oficial do Exército, ex-governador de Macau

Inês Serra Lopes, 5271, advogada e jornalista

Francisco Mantero, 5269, presidente do Conselho Estratégico para a Cooperação, Desenvolvimento e Lusofonia Económica da CIP

Pedro Rebelo de Sousa, 5238, advogado

Luís Campos e Cunha, 4821, professor universitário, ex-ministro das Finanças

João Varandas Fernandes, 4810, médico, político e dirigente desportivo

Emília Nadal, 4535, artista plástica

Almirante Francisco Vidal Abreu, 4190, oficial de Marinha, ex-CEMA, presidente do conselho académico da Academia de Marinha

Nuno Cardoso, 3857, engenheiro, ex--presidente da Câmara Municipal do Porto

José Rueff Tavares, 3626, médico e investigador, ex-membro do CNECV

Bruno Bobone, 3625, empresário português, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa

Eduardo Marçal Grilo, 3567, engenheiro, ex-ministro da Educação, administrador da Fundação Calouste Gulbenkian

Afonso Pereira Inácio, 3542, economista, dirigente da APDQ

Sofia Afonso Ferreira, 3314, fundadora do Democracia21

Luís Mira Amaral, 2609, engenheiro e economista, administrador de empresas, professor universitário, ex-ministro da Indústria

Rui Vilar, 2570, jurista, gestor e administrador de empresas, ex-ministro em diferentes pastas, ex-presidente da Fundação Calouste Gulbenkian

Manuel Tinoco de Faria, 2520, advogado

Jorge da Paz Rodrigues, 2444, líder de movimentos cívicos

Laura Vidal, 2404, fundadora e líder da Conexão Lusófona

Rui Reininho, 2402, músico

Nuno Ribeiro da Silva, 2383, economista, ex-secretário de Estado, presidente da Endesa Portugal

General Quesada Pastor, 2319, oficial do Exército

Almirante António Rebelo Duarte, 2297, oficial da Marinha

Sofia Galvão, 2296, advogada, ex-secretária de Estado

Francisco Oliveira Dias, 2263, médico, ex-presidente da Assembleia da República (entretanto, já falecido)

João Bosco Mota Amaral, 2244, jurista, ex-presidente do Governo Regional dos Açores, ex-presidente da Assembleia da República

Esmeralda Dourado, 2184, engenheira, gestora e administradora de empresas

Agostinho Pereira de Miranda, 2168, advogado, fundador da Miranda Alliance

Paulo Carmona, 2156, gestor, presidente do FAE – Fórum dos Administradores de Empresa

Rosalia Vargas, 2153, presidente da Agência Ciência Viva

Almirante António Balcão Reis, 2145, oficial da Marinha

Almirante Nuno Vieira Matias, 2140, oficial da Marinha, ex-CEMA

Pedro Velez, 2080, jurista, professor universitário e coautor do projeto de lei de reforma eleitoral

Maria Ester Vargas, 2009, professora, ex-deputada

Margarida Mercês de Mello, 1994, apresentadora de televisão, autora e realizadora de documentários

José Marques Vidal, 1993, magistrado do Ministério Público, ex-vice-procurador-geral da República, ex-diretor-geral da Polícia Judiciária e juiz conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo

Nuno Roby Amorim, 1978, ex-jornalista, consultor de comunicação

Isilda Pegado, 1972, advogada, ex-deputada, dirigente da FPV

Margarida Gonçalves Neto, 1962, médica, ex-coordenadora nacional para os Assuntos da Família

José da Silva Peneda, 1956, economista, ex-ministro do Trabalho, ex-deputado ao Parlamento Europeu

Carina João Oliveira, 1946, engenheira civil, ex-deputada

Jorge Marrão, 1918, auditor, diretor da Deloitte, presidente da Missão Crescimento

Jacinto Lucas Pires, 1916, escritor

Matilde Sousa Franco, 1875, historiadora, académica, ex-deputada

Hélio Loureiro, 1885, chef

António Gentil Martins, 1814, médico

Manuel Braga da Cruz, 1796, professor universitário, ex-reitor da Universidade Católica

General José Rocha Vieira, 1717, oficial do Exército, ex-governador de Macau

Joaquim Vairinhos, 1707, ex-presidente da Câmara Municipal de Loulé, ex-deputado ao Parlamento Europeu

José Sucena Paiva, 1700, professor universitário e cientista, fundador e primeiro presidente do conselho de administração do Taguspark

José Roquette, 1632, economista, empresário, ex-banqueiro e ex-dirigente desportivo

Miguel Cadilhe, 1597, economista e político, ex-ministro das Finanças

Guilherme Valente, 1518, editor

Carlos Móia, 1464, empresário e dirigente desportivo

António Pinheiro Torres, 1459, advogado e ex-deputado

Martim Borges de Freitas, 1456, ex-dirigente parlamentar, dirigente associativo empresarial

Luís Cabral da Silva, 1454, engenheiro, especialista em transportes e vias de comunicação

Michael Rothwell, 1431, professor, dirigente da Comunidade Judaica do Porto

Manuel Serrão, 1422, empresário, comentador na televisão

Ana Cid Gonçalves, 1418, secretária-geral da APFN

Afonso Camões, 1254, jornalista e gestor

Fernando Paes Afonso, 1166, economista, gestor, ex-vice-provedor da SCML

Fernando Adão da Fonseca, 1164, economista, professor universitário, administrador de empresas, fundador do Fórum para a Liberdade de Educação

Marco Galinha, 1143, empresário

José de Melo Alexandrino, 1020, jurista, professor universitário

António Capucho, 987, político, ex-deputado nacional e europeu, ex-ministro, ex-conselheiro de Estado

Tiago Craveiro, 696, dirigente da FPF

Pedro Quartin Graça, 406, advogado, professor universitário e político, ex-deputado

Ventura Leite, 341, economista, político, ex-deputado

Henrique Neto, 278, empresário e gestor, ex-deputado, ex-candidato à Presidência da República

António Barreto, 227, cientista social, político, ex-ministro da Agricultura, investigador e cronista

Manuel Ramalhete, 82, economista e professor universitário

José de Azevedo Pereira, 51, economista, professor universitário, ex-presidente da Autoridade Tributária, dirigente da SEDES

Pedro Sampaio Nunes, 41, engenheiro, ex-vice-provedor da SCML, alto dirigente na Comissão Europeia, ex-secretário de Estado

João Luís Mota Campos, 36, advogado, ex-secretário de Estado da Justiça, dirigente da APDQ

José António Girão, 33, economista, professor universitário, dirigente da APDQ

Rui Paiva, 32, empresário, dirigente da SEDES

Ana Marta Castro, 23, advogada, coautora do projeto de lei de reforma eleitoral

António Pinho Cardão, 22, economista, administrador de empresas, dirigente da APDQ

António José Mocho, 21, consultor de comunicação, dirigente da APDQ

João de Jesus Ferreira, 14, engenheiro e consultor

Álvaro Beleza, 12, médico e político, dirigente da SEDES

Clemente Pedro Nunes, 11, engenheiro, professor universitário, empresário

João Duque, 10, economista, professor universitário, presidente da SEDES

Fernando Teixeira Mendes, 9, engenheiro, empresário, dirigente da APDQ

Gustavo Mesquita Guimarães, 6, economista, gestor, empresário

Gonçalo Carrilho, 5, jurista, assistente universitário, coautor do projeto de lei de reforma eleitoral

Maria João Louro, 4, economista, consultora, dirigente da SEDES

Luís Alves Monteiro, 3, engenheiro, administrador de empresas, presidente do Instituto Francisco Sá Carneiro

A petição ainda pode ser subscrita em: https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania

Muito obrigado a todos pelo apoio a esta causa de cidadania.


José RIBEIRO E CASTRO
Advogado
Subscritor do Manifesto "Por uma Democracia de Qualidade"

sexta-feira, 31 de maio de 2019

Olá, Fernando! Estás bom, pá? Um abraço


Uma das fotos da reportagem do jornal O Século, que narrou a nossa aventura.
Nós somos os dois de pé, à esquerda: o meu irmão atrás, eu à frente.


Desde que morreste, há coisa de cinco anos, só posso falar contigo por escritos como este, hoje, no Dia dos Irmãos, que é 31 de Maio. Ou também numa ou noutra oração para que estejas bem e, uma ou outra vez, quando os outros, olhando-me, noite entrada, são capazes de pensar que estou a falar sozinho. É uma chatice quando alguém parte cedo de mais. 61 anos é ainda demasiado cedo, quando tinhas tanto a dar e muita energia para gastar.

Há dias em Odemira, encontrei uma coisa a que vais achar graça. No escritório, ficou aquela secretária enorme do avô e respectiva estante. Remexendo numa gaveta, onde estão lápis, esferográficas, clips, borrachas, lacre, envelopes, encontrei um recorte de jornal muito dobradinho. Abri-o. É de O Século, de 21/7/1970, como está anotado pela letra do avô. É uma peça a três colunas, com quatro fotografias grandes. Devia ocupar uma meia página do jornal. O título, largo, é: “Salvos com dificuldade nas águas revoltas do Tejo quatro jovens cujo barco se voltou ao largo de Paço de Arcos”.

É isso mesmo: conta a nossa aventura que podia ter acabado muito mal. A reportagem começa assim: “A meio da tarde de ontem registou-se, ao largo da doca de Paço de Arcos, um acidente com uma pequena embarcação de recreio, no qual só por sorte e devido a serem bons nadadores, não foram tragados pelo mar quatro jovens (três rapazes e uma rapariga).” E lá diz quem éramos: “Seguia como patrão o cadete Fernando Augusto Castro, de 18 anos, acompanhado por seu irmão, José Duarte Castro, de 16, também cadete, e por dois amigos, Leonor Ramos, igualmente de 16, e pelo irmão desta, Salvador Sequeira, de 15, ambos estudantes.” O jornalista, vê lá tu, fez-me também cadete da Armada, certamente por ter imaginado a destreza com que nos safámos do naufrágio. A bordo do pequeno veleiro, classe “vouga”, do CNOCA, o Clube Náutico dos Oficiais e Cadetes da Armada, havia dois heroicos marinheiros, sábios navegadores: Fernando Augusto e José Duarte.

É impossível esquecer esse 20 de Julho, dia de anos do pai (fazia 48), que estava com a mãe em Lourenço Marques, numa conferência de cidades – nem sonharam a surpresa que lhes preparámos, se tivesse dado para o torto. O combinado era reunirmo-nos todos em Luanda – eu a 22, tu a 23.

A navegação do Alfeite para Santo Amaro tinha sido uma maravilha. Tu ao leme e na retranca com a vela grande e eu à proa no estai, parecíamos Vasco da Gama e seu imediato. Mas, no regresso, aquela manobra ousada de, com nortada muito forte e mar cheio de ondulação, irmos competir para o meio da embocadura do Tejo com outro veleiro, que fazia à vontade três do nosso “vouga”, revelou-se fatal. Conta o jornalista: “Tudo parecia correr da melhor maneira, quando, já no regresso à capital, a pequena embarcação, que navegava a cerca de mil metros da praia de Paço de Arcos, foi apanhada por violenta nortada, que, entretanto, se levantou naquela zona, e violento cachão e depois por uma volta do mar.” Segue a história trágico-marítima, focada no perigo extremo em que logo ficou o Salvador: “A situação agravou-se, tanto mais que a corrente naquele momento era também muito forte, dando origem a que o barco se voltasse, tendo caído ao mar todos os ocupantes, com excepção do Salvador, que ficou dentro da caixa do pequeno beliche da embarcação. A muito custo, o rapaz lançou-se à água e, a nado, conseguiu meios de safar-se pelos próprios meios da crítica situação, aproveitando a bolsa de ar formada pelo barco. Após certa luta com o mar, muito agitado, foi ao encontro dos companheiros que, nadando também com grande energia, e embora contra a corrente, conseguiram, ao fim de longo esforço, alcançar de novo a embarcação, para a qual se conseguiram, finalmente, içar.”

O quadro estava preto. Não conseguíamos endireitar a embarcação para ficarmos mais seguros. Manobrando com o nosso peso sobre o patilhão, duas vezes conseguimos pô-la direita; mas, com o vento e o peso da água que inundara o interior, logo se virava com o mastro para baixo. Estávamos já a mais de uma milha da costa e o dia a acabar. A corrente empurrava para fora. A esperança estava em alguém que nos visse na marginal e aos sinais que fazíamos. A ironia era estarmos em frente do Instituto de Socorro a Náufragos em Paço d’Arcos.

E foi a ironia que nos salvou: um passante viu-nos ainda a navegar; foi chamar a mulher para ver também o atrevimento do veleiro pequeno que voava atrás do veleiro grande; quando a mulher chega à amurada, só vê o veleiro grande e comenta, a rir-se, que o marido estava a ter visões; este quis provar que tinha razão, continuou de olhar fixo na área onde nos vira a navegar e viu, por duas vezes, o “vouga” endireitar-se e virar-se outra vez. Foi chamar mais gente. E todos viram os nossos sinais. Veio, então, o socorro do ISN. É o que conta a notícia: “Entretanto, os sinais foram vistos de terra por pessoas que imediatamente participaram o caso ao Instituto de Socorros a Náufragos, de Paço de Arcos, tendo avançado para o local o salva-vidas Almirante Freixo, sob o comando do patrão sr. Domingos Camarão e conduzido pelo motorista sr. José Augusto Canga, os quais acabaram por recolher os quatro jovens e rebocaram para a doca de Paço de Arcos a embarcação. O salvamento só foi possível devido à rápida intervenção do salva-vidas Almirante Freixo, pois com a fúria do mar, que aumentava de momento a momento, os quatro jovens já sem forças para se debaterem teriam sido arrastados pela forte corrente.”

A narrativa acaba com testemunhos mais ou menos abananados, depois de o jornalista elogiar as competências dos irmãos marinheiros: “A experiência dos dois cadetes, rapazes já com boas noções náuticas e conhecedores do mar, conseguiu acalmar os dois outros jovens que viveram momentos de profunda aflição na ânsia de se salvarem.” A mim, ficou-me a bastar ser arvorado em cadete pelo jornal. Mas, a ti, que o eras de verdade, sempre me pareceu, quando concluíste a Escola Naval, que não bastava seres o primeiro do teu curso, o “penico” do curso Afonso Cerqueira (o AC), mas cumpria que, em memória do “vouga” do CNOCA, te tivessem entregue uma distinção por honra, bravura e glória. Ficaram a dever-te esta.

Fizemos muitas aventuras. Nenhuma foi tão perigosa quanto este passeio no rio se tornou. Mas a pior aventura e a mais estúpida de todas foi termos começado a fumar. Éramos muito novos e o cigarro era um modo de afirmação. Foi esta aventura que te levou; e, embora eu tenha já deixado de fumar vai quase para 20 anos, a verdade é que não sei o mal que deixou e ainda fará.

A seguir ao naufrágio, juntámo-nos aos pais em Angola, como previsto, para um mês em Luanda com os tios e os primos. Olha: um programa de irmãos em diferentes tabuleiros. Marcou-me tanto essa estadia em Angola… Lembro-a muitas vezes como o tempo da minha vida em que, tendo muitas perguntas, recebi todas as respostas. De Angola. Há ali um feitiço qualquer. Não sei se se passou o mesmo contigo. Grande terra, gente fantástica. E ir aos sítios que o pai e o tio tinham contado da sua infância e juventude em Luanda e observar se eram iguais, ou não, ao que tínhamos imaginado – foi como reler uma novela ao vivo. Verdadeiramente único.

Há poucos dias, a Maia mandou-nos um vídeo dos meus netos de Macau, que já não te conheceram. Têm cinco e quatro anos. Fazem-me lembrar muito de nós os dois, quando os vejo a brincar ou a conversar. São dois rapazes, com um ano e picos de diferença – como nós. O vídeo mostra o mais velho a montar um aparelho luminoso, que vinha num estojo de “pequeno cientista”. A cena da montagem é deliciosa, com o mais novo, por trás ou ao lado, a seguir tudo com absoluta atenção e, às vezes, entrando a ajudar. Conseguiram montar a engenhoca, para orgulho da mãe que nos enviou o vídeo.

Daqui por uns anos, quando evoluírem para a química ou a física avançada, como nós fizemos com aquelas caixas magníficas do Chemical Engineering e material improvisado na drogaria, terei curiosidade em ver se a mãe terá o mesmo desvelo com as experiências químicas como as que fazíamos na casa de banho (e levavam a nossa mãe a um ataque de nervos, embora deixássemos tudo em ordem, com excepção daquele espelho que teve de ser substituído) ou investigações eléctricas, que rebentavam frequentemente o quadro. A verdade é que ficámos peritos em fusíveis e a electricidade não tem segredos para nós. Mas, hoje, com os disjuntores, imagino que, acima de certa carga, possa ser mais complicado.

Continuo a cruzar-me com pessoas que, não só na Marinha, se cruzaram contigo e me falam com saudade de ti. Não há dúvida, Fernando: deixaste uma boa pegada ecológica. Fizeste bom ambiente por onde passaste.

E os meus filhos, quando falamos de ti, dizem-me sempre que somos iguais. Os teus filhos também dizem isso. Eu não acho, mas talvez seja assim, à medida que fomos caminhando para velhos. Os nossos filhos o mais citam, como prova, são as nossas gargalhadas, de que se lembram quando estávamos juntos. Esta parte é que é a parte chata: não se consegue gargalhar sozinho.

No outro dia, dei-me conta de que, agora, sou mais velho que tu. Fui sempre o mais novo e, agora, sou mais velho. Tu paraste o teu contador e o meu continua a contar. Já vou com um pouco mais de três anos do que aqueles que fizeste. E tinha um ano e meio para menos. Esta parte também não gosto. Não me dá jeito nenhum ser mais velho. Como estava é que estava bem. E podíamos gargalhar os dois.

Olha: não sei se poderás responder-me e não estou a contar com isso. Nas nossas conversas agora, falo eu. E está bem assim. Mas, se me responderes, não quero que me contes como é onde tu estás. Se tiver a sorte de, um dia, ir ter contigo onde tu estás, eu quero ter o prazer de o descobrir e conhecer por mim próprio. Depois, poderás mostrar-me algum recanto de que gostes mais, como o pai e o tio fizeram connosco em Luanda naquele 1970 do naufrágio. Não contes agora.

Olha pelos teus filhos e netos. E, já agora, olha também pelos meus filhos e netos. Obrigado pelo tempo que passámos juntos. Obrigado por tudo o que crescemos.

José Ribeiro e Castro

quarta-feira, 24 de abril de 2019

Eleger o deputado, não só o partido – o modelo português

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José Ribeiro e Castro, saído hoje no jornal i.
O sistema eleitoral deve assegurar bem a tripla representação democrática do país: a equilibrada representação do território, a efectiva representação da cidadania, a justa representação das correntes políticas.


Eleger o deputado, não só o partido – o modelo português 
Numa altura em que se aproxima do fim a apreciação parlamentar da Petição n.º 589/XIII/4, já com 7.237 subscritores, cabe recapitular a reforma de sistema eleitoral proposta pela SEDES e pela APDQ: prevê 229 deputados (hoje, são 230); a emigração mantém quatro deputados, repartidos por dois círculos (Europa e resto do Mundo), com as regras atuais de eleição; reservam-se 15 mandatos para um círculo nacional de compensação ou repescagem; e 210 mandatos são distribuídos pelo território nacional, dividido em círculos plurinominais e uninominais, segundo a divisão política e administrativa do país.
O sistema proposto é frequentemente designado como o “modelo alemão”. Este é, dos sistemas mistos de compensação que há no mundo, o mais próximo daquele que preconizamos e ajuda, com a sua longa prática, a esclarecer muitas dúvidas. Mas o nosso é uma proposta original, ajustada às características e necessidades de Portugal e à nossa tradição recente, além de traduzir fielmente o que a Constituição preconiza desde 1997. É, por isso, o modelo português:
Artigo 149.º
Círculos eleitorais
1. Os Deputados são eleitos por círculos eleitorais geograficamente definidos na lei, a qual pode determinar a existência de círculos plurinominais e uninominais, bem como a respectiva natureza e complementaridade, por forma a assegurar o sistema de representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt na conversão dos votos em número de mandatos. 
2. O número de Deputados por cada círculo plurinominal do território nacional, excetuando o círculo nacional, quando exista, é proporcional ao número de cidadãos eleitores nele inscritos. 
Os círculos plurinominais correspondem, como hoje, ao território das regiões autónomas e, no Continente, dos distritos, estabelecendo-se a regra de elegerem, no mínimo, oito deputados, o que leva a agregar distritos vizinhos de peso inferior até atingir aquele mínimo. As regiões autónomas mantêm a individualidade política, cabendo seis deputados a cada.
Os círculos uninominais, que designam um deputado cada, correspondem a subdivisões do território dos círculos plurinominais em número de metade dos deputados que caibam à respectiva circunscrição – segue-se o princípio da repartição paritária dos candidatos em listas plurinominais e em círculos uninominais, como na Alemanha. Por exemplo: se o círculo de Lisboa eleger 42 deputados, terá 21 círculos uninominais e listas plurinominais de 21 candidatos cada; o círculo da Madeira, por seu turno, com seis deputados, terá três círculos uninominais e listas plurinominais de três candidatos cada. Também os círculos uninominais deverão respeitar a divisão administrativa do país, quanto a municípios e freguesias: os municípios vizinhos que se agregam até terem os eleitores suficientes para a escolha de um deputado, têm de ser agregados inteiros; e só podem ser fracionados, quando, nos municípios mais populosos, caibam dois ou mais deputados – e, neste caso, cada círculo uninominal inframunicipal só pode agregar freguesias inteiras dentro de um mesmo município.
Cada eleitor terá, no seu boletim, um duplo voto: por um lado, vota num partido ou coligação, no círculo plurinominal; por outro, escolhe o deputado da sua preferência no território de maior proximidade, o círculo uninominal. 
A votação no círculo uninominal serve unicamente para designar o respectivo vencedor – estas votações não se somam nem a nível regional ou distrital, nem a nível nacional. O voto no partido ou coligação é que determina a composição proporcional da Assembleia, tal como hoje: reparte proporcionalmente entre partidos ou coligações os lugares, por regiões ou distritos; e é a soma destas votações que dá os resultados no território nacional.
Os mandatos são atribuídos dando prioridade aos candidatos que tenham vencido nos círculos uninominais: estes são eleitos, à cabeça, dentro da quota regional ou distrital do respectivo partido ou coligação, à frente dos candidatos na respectiva lista plurinominal. Os outros candidatos nas listas plurinominais são eleitos, de seguida, pela sua ordem e dentro da proporção que ainda couber. Por exemplo, regressando ao exemplo da Madeira (seis deputados) de há pouco, imaginemos um partido que obteve 50% dos votos (correspondendo a três mandatos no todo regional) e cujos candidatos individuais venceram nos três círculos uninominais: elege estes três deputados e nenhum da respectiva lista. Imaginemos um partido que obteve 30% dos votos na contagem plurinominal (correspondendo a dois mandatos pelo método d’Hondt) e cujos candidatos não ganharam nenhum uninominal: elege os dois primeiros deputados na respectiva lista. Mas imaginemos que este partido com 30% dos votos e dois mandatos, teve um candidato a vencer num círculo uninominal: elege este vencedor uninominal e o primeiro da lista plurinominal.
Assim se cumpre a exigência constitucional: “círculos plurinominais e uninominais [em] complementaridade, por forma a assegurar o sistema de representação proporcional”. Os 210 deputados eleitos pelos círculos territoriais são eleitos em moldes proporcionais, sendo metade deles (105) eleitos directamente pelos eleitores, com prioridade dentro da quota proporcional obtida pelos respectivos partidos. 
Finalmente, o círculo nacional, com os 15 últimos mandatos. É um círculo sem candidatos, já que todos os candidatos têm que ter relação com o território. O círculo nacional completa o primeiro escrutínio por regras de repescagem: assegura uma margem razoável de aceitação de “mandatos supranumerários”, os candidatos que vençam em círculos uninominais, mas acima da quota proporcional do seu partido; e garante a proporcionalidade da representação parlamentar, onde tenha sido distorcida por algum factor do apuramento. Actualmente, esta distorção acontece em todas as eleições, mas não é corrigida.
É cumprido o princípio fundamental do Manifesto por uma Democracia de Qualidade, de 2014. O sistema eleitoral deve assegurar bem a tripla representação democrática do país: a equilibrada representação do território, a efectiva representação da cidadania, a justa representação das correntes políticas. 
O sistema é muito simples, sobretudo para o eleitor: ao longo do dia, os cidadãos exprimem, com duas cruzinhas no boletim de voto, a escolha de um partido ou coligação e a escolha do seu deputado; e, ao fim da noite, vêem uma Assembleia proporcional como hoje, mas em que metade dos deputados foram escolhidos por si e os demais influenciados determinantemente pela cidadania na formação das listas e candidaturas. Faz toda a diferença.
Não há qualquer razão para não caminharmos neste sentido. Não há qualquer razão para continuarmos a não resgatar a democracia ao descontentamento e à decadência. 
Estamos à espera de quê?

José RIBEIRO E CASTRO
Advogado
Subscritor do Manifesto "Por uma Democracia de Qualidade"

NOTA: artigo publicado no jornal i

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Sistema eleitoral: porquê ter o mau, se podemos ter o bom?

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José Ribeiro e Castro, saído hoje no jornal i.
Com votações uninominais em todo o território para metade dos mandatos, não há bruxedo em o resultado ser proporcional. Como tenho dito, não é bruxedo, é apenas inteligência. O sistema alemão – o mais próximo de nós – é, de facto, magnífico.

Ilustração da estrutura de um boletim para duplo voto

Sistema eleitoral: porquê ter o mau, se podemos ter o bom?  
O sistema que temos nas eleições legislativas não tem, em si mesmo, nada de mau: representação proporcional sobre candidaturas plurinominais de partidos ou coligações. É um bom sistema, um sistema justo. Foi adoptado, ainda por um Governo Provisório, na primeira lei eleitoral pós-25 de Abril para as constituintes de 1975. A Constituição consagrou-o para o futuro. Mostrou plasticidade suficiente para vencer a maior crítica: dificultar a governabilidade. Em 43 anos, proporcionou várias soluções de governo e deu algumas maiorias absolutas.

Porém, foi progressivamente apossado pelos directórios e outros grupos, ao ponto de anular em absoluto a mera influência dos cidadãos na escolha dos deputados. Cavou um fosso profundo entre eleitos e eleitores, desresponsabilizou os deputados, generalizou a quebra de confiança. Tornou-se num sistema capturado, de listas fechadas e práticas cada vez mais fechadas – um sistema mau, mal visto pelo eleitorado. Os cidadãos sabem que os deputados não são seus, mas de quem manobra nos partidos.

A revisão constitucional de 1997 respondeu ao problema, indicando, no art. 149º, o sistema misto “de círculos plurinominais e uninominais, (…) [em] complementaridade, por forma a assegurar o sistema de representação proporcional”. A Constituição passou a apontar para um sistema muito bom. Mas, passados 22 anos, estamos na mesma e o sistema em degradação crescente. É a hora de a cidadania levar os partidos a seguirem a oportunidade constitucional e efectivarem a reforma avançada pela petição “Legislar o poder de os cidadãos escolherem e elegerem os seus Deputados” < http://tinyurl.com/y46vd533 >.

Neste debate, é frequente ouvirmos uma cascata de preconceitos contra os círculos uninominais. Apontam realmente a outros sistemas (sistemas maioritários, só com círculos uninominais), ou a outro tipo de sistemas mistos (os chamados sistemas mistos paralelos) sem a perfeição do modelo para que aponta a Constituição. Este modelo é uma evolução do sistema actual, acrescentando-lhe a componente decisiva para lhe devolver saúde democrática.

Muitos pensarão não ser possível que um sistema onde metade dos deputados é escolhida em círculos uninominais seja um sistema rigorosamente proporcional. Isto não só é possível, como já existe: o sistema alemão, que, eleição após eleição desde 1949, mostra como é até mais proporcional do que o nosso. Com votações uninominais em todo o território para metade dos mandatos, não há bruxedo em o resultado ser proporcional. Como tenho dito, não é bruxedo, é apenas inteligência. O sistema alemão – o mais próximo de nós – é, de facto, magnífico.

Na proposta da APDQ e da SEDES com 229 deputados, a representação proporcional personalizada é aplicada a 225 – para os quatro deputados da emigração o sistema manter-se-ia o actual. Àqueles 225 mandatos em território nacional, o novo sistema seria aplicado, directamente, a 210 e, indirectamente, aos 15 de atribuição final pelo círculo nacional. Os 210 mandatos são repartidos de modo paritário entre 105 círculos uninominais e outros 105 em listas plurinominais. A repartição paritária aplica-se em todo o território, circunscrição a circunscrição: os Açores, com seis deputados, teriam três círculos uninominais e outros três nas listas plurinominais; o Porto, com 36 deputados, teria 18 círculos uninominais e outros 18 nas listas plurinominais; e assim sucessivamente.

Esses 105 círculos uninominais mudam tudo, mas apenas o que é necessário; não muda a proporcionalidade da representação. Teremos uma Assembleia mais proporcional por se agregarem os círculos mais pequenos, não havendo, no Continente, circunscrições abaixo de oito deputados. A pequenez de alguns círculos é, hoje, a principal causa de desigualdade e fonte de votos jogados no lixo.

As candidaturas uninominais influenciam tudo. São igualmente apresentadas pelos partidos ou coligações, mas estes têm de apresentar os melhores candidatos no conceito público. Em vez de a campanha se limitar ao líder às voltas com a televisão atrás, haverá, pelo menos, 105 campanhas em todo o território, com alguns duelos interessantes. Os candidatos uninominais podem também figurar nas listas, o que, neste sistema misto de compensação, faz todo o sentido; e, se assim for, caso não ganhem o voto uninominal, podem ser eleitos nas listas pelo voto proporcional. Os eleitores poderão, assim, ter mais do que um deputado próximo: o vencedor uninominal e outro ou outros que, estando também na lista plurinominal, entrem pelo voto proporcional. Ou seja, os vencedores uninominais não estarão sozinhos, mas terão marcação directa e concorrência na Assembleia da República. Não serão caciques instalados – ao contrário de hoje, em que há muitos caciques que nem vão a votos, mas mexem os cordéis, mandam na sombra. Isso tenderá a desaparecer.

Também não há razão para o receio de o voto uninominal arrastar o plurinominal, prejudicando os mais pequenos. É ao contrário. A evidência mostra que, neste sistema, o “voto útil” não prejudica a representação: os partidos mais pequenos não são prejudicados e os maiores não se beneficiam à sua conta. O chamado “voto útil” consiste em o eleitor de um partido mais pequeno votar noutro maior, por razão táctica ou convicção de utilidade. No sistema actual, não tem remédio: dado o “voto útil”, ele fica lá, não tem regresso. No sistema que propomos, não se passará assim, porque o eleitor tem duplo voto: vota num deputado e vota num partido. Um eleitor vulnerável ao “voto útil”, poderá usá-lo no voto uninominal para ajudar o candidato dum partido maior a ganhar; mas já não repetirá o gesto no voto partidário plurinominal. Por regra, não “trairá” duas vezes. Ora, como o voto que conta para a composição do Parlamento é o voto partidário, o “voto útil” deixará de afectar a representação proporcional.

É facto – resulta da matemática – que os maiores partidos elegerão a maior parte dos uninominais. Mas isso em nada os beneficia, pois terão a mesma exacta percentagem na Assembleia, elegendo muito menos das listas. Por exemplo, em 2017, na Alemanha, a CDU elegeu 185 uninominais – consequência: só elegeu mais 15 das listas. E a sua irmã CSU venceu todos os 46 uninominais na Baviera – consequência: não elegeu ninguém das listas, sendo os 46 lugares da lista bávara repartidos pelos outros partidos. No voto partidário, a CDU e a CSU tiveram 26,8% e 6,2%, a nível nacional; na representação parlamentar, ficaram com 28,2% e 6,5% dos lugares. Quanto aos partidos mais pequenos do Bundestag, o Die Linke e os Verdes só ganharam respectivamente em cinco e um círculos uninominais – consequência: elegeram das listas os seus restantes 64 e 66 deputados. No voto partidário, tiveram 8,6% e 8%; na representação parlamentar, ficaram com 9,7% e 9,4% dos lugares. Mais proporcional não pode haver.

Esta é, portanto, a questão: se podemos ter o bom, por que continuaremos a ter o mau? Se podemos escolher deputados, e não só partidos, por que continuamos a entregar todo o poder aos partidos? Por que continuamos a aceitar não ser representados na Assembleia da República?

Não pode ser. É hora de mudar.
José RIBEIRO E CASTRO
Advogado
Subscritor do Manifesto "Por uma Democracia de Qualidade"

NOTA: artigo publicado no jornal i

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Outro cúmulo da hipocrisia e do disfarce político


O Damas de Branco é um grupo de mães e esposas de "presos de consciência" do regime socialista cubano. É composto por familiares e esposas de cidadãos presos por serem opositores ao regime político da ilha e lutarem pela liberdade.

São mulheres corajosas que há muitos anos combatem em prol da libertação dos membros da sua família presos por razões políticas pelo regime tirânico da Cuba comunista.

Apesar da repressão que se abate sobre as suas manifestações, continuam a manifestar-se em marchas pacíficas, vestidas de branco, para chamar a atenção. E chamam. Tanto assim que o regime comunista reprime essas simples marchas e prende recorrentemente várias das manifestantes.

Coragem e dignidade é o que não lhes falta.


Ontem, no discurso do estado da nação feito por Donald Trump perante o Congresso Americano, pude ver na televisão um grupo de deputadas democratas, igualmente vestidas de branco, que se manifestavam ruidosamente e riam e brincavam enquanto o presidente discursava.

Que contraste! De um lado, mulheres que lutam pelos direitos básicos da democracia e da liberdade, com as únicas armas ao seu dispor: coragem e dignidade vestida de branco. Do outro, um bando de brincalhonas, que só correm o risco de cair no ridículo, a brincar às lutadoras pela democracia, imitando as corajosas cubanas, no Congresso onde são legisladoras e no seio de uma República que lhes assegura todas as liberdades.


Tive vergonha por elas. 

Os cúmulos da hipocrisia e da desfaçatez


O nosso Donald, sim que também temos um, o Tusk, a propósito da iniciativa do Governo Britânico no sentido de reabrir as negociações com a UE e encontrar uma solução para o célebre backstop para a fronteira da Irlanda do Norte com a República da Irlanda, declarou que que a UE não tinha “nenhuma nova oferta” a fazer e que o acordo não estava aberto a “novas negociações”.

Disse também que ainda acredita numa “solução comum” se for possível encontrar uma solução que garanta a paz na Irlanda no Norte. Oi?!

Donald Tusk é um polaco. Foi primeiro-ministro da Polónia. Como se sentiria essa qualidade se a UE tivesse imposto à Polónia uma solução fronteiriça, por exemplo com a Ucrânia, como condição para a admitir na União Europeia? Teria achado que isso era uma intromissão inaceitável na sua soberania?

Já todos percebemos que o fulcro da questão entre a União Europeia e Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, não é a questão económica do mercado comum, não é a livre circulação de pessoas entre ambos os espaços, não é a permanência dos cidadãos da UE no Reino Unido nem a dos cidadãos deste na União Europeia, é uma pura questão política e amor-próprio dos Ingleses: eles não podem tolerar que a União lhes imponha uma solução que diz respeito à sua unidade territorial e às suas fronteiras.

A Irlanda é uma ilha dividida em duas partes: a sul, a República da Irlanda que no século passado entendeu separar-se do Reino Unido. Os católicos, maioritários no sul, não queriam continuar a ser governados por um reino anglicano. Era o direito deles e exerceram-no.

A norte, o Ulster, uma parte da Irlanda em que os anglicanos são maioritários e não queriam ser governados por uma maioria católica e republicana. Era o direito deles e o Reino protegeu-o e tem-no protegido ao longo das muitas décadas que a República da Irlanda já leva de independência.

O resultado foi o de que entre as duas partes da Ilha surgiu uma fronteira. Enquanto a RI seguiu a liderança britânica e se acolheu na esfera económica do Reino, não verdadeiramente problemas entre os dois países. Problemas houve no Ulster onde a minoria católica iniciou uma virulenta campanha com recurso ao terrorismo e à luta armada (o IRA, para quem não saiba, Irish Republican Army) com o objectivo de se separar do Reino e juntar-se à República, contra a vontade da maioria anglicana.

O célebre acordo de sexta-feira santa, celebrado com a bênção dos EUA e do seu Presidente Clinton, iniciou um processo de desarmamento do IRA e uma época de paz na Irlanda do Norte com a muito activa colaboração da República, entretanto integrada com o Reino no seio da UE.

Uma parte essencial do acordo assumia o pressuposto de que os irlandeses de ambos os lados da fronteira podiam beneficiar de uma completamente livre circulação entre ambas as partes da ilha.

Mas, na verdade, todos os países europeus têm fronteiras com outros países europeus, salvo Chipre que é uma Ilha e só tem fronteira terrestre com a entidade cipriota turca. Fronteira aliás bem mais complicada que a da Irlanda, mas que parece não preocupar em nada os mandarins de Bruxelas…

Vários países europeus membros da UE têm fronteira entre si e vigiam-na. Por exemplo, ninguém pode, ou deve, atravessar a linha de fronteira fora dos postos fronteiriços autorizados;

Vários países europeus têm fronteira com outros países europeus que não são membros da UE e têm fronteiras vigiadas e, nalguns casos, até «muradas» como é o caso da Hungria…

Vários países europeus da UE têm fronteiras com países não europeus: a Espanha com Marrocos, a Grécia com a Turquia, por exemplo.

Todas estas fronteiras são «hard borders», mais ou menos rígidas, algumas militarizadas, algumas palco de manobras militares para intimidar a vizinhança (os países bálticos com a Rússia, por exemplo), mas todas vigiadas.

O que faz então a especificidade da fronteira Irlandesa? Bom, muito simplesmente o facto de a República da Irlanda ser membro da UE e o Reino Unido querer sair, o que implica reinstalar uma fronteira mais ou menos vigiada onde antes só havia uma linha imaginária.

Que os Irlandeses do sul, habituados a considerar sua toda a ilha, não gostem, entende-se; mas, alguém pode de boa-fé impor ao Reino Unido que desista de ter fronteiras, lá porque sai da UE?

Ambas as partes entendem que ter uma fronteira o mais ligeira possível é bom para ambas, mas que há uma fronteira, há, pelo simples facto de que há muitas décadas a Irlanda do Sul decidiu tornar-se independente e criar um novo país. Um novo país significa novas fronteiras…, ou não?

O que se entende mal é que a União Europeia faça desta abusiva imposição ao Reino Unido a pedra de toque da questão do Brexit. O que a União está a dizer é que não aceita que o Reino Unido tenha as suas fronteiras. Fronteira, só as dela… Ora isto é de facto inaceitável.

Mas, que o Sr. Tusk invoque a paz na Irlanda do Norte, parte constituinte do Reino Unido, como causa dessa intransigência, é de uma hipocrisia assustadora. A paz na Irlanda do Norte, tal como no País Basco em relação à Espanha ou na Córsega em relação à França, é uma questão interna dos Britânicos, não dos polacos. Os polacos que se preocupem com os seus próprios problemas, que parece que são muitos…

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Um exemplo fatal da nossa incompetência colectiva

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José Ribeiro e Castro, saído hoje no jornal i.
Dívida pública acima dos 250 mil milhões de euros, correspondendo a cerca de 126% do PIB. O limite intransponível no quadro europeu era de 60%. Subimos para mais do dobro; e por lá temos andado. Como se chegou aqui? 
 
Um exemplo fatal da nossa incompetência colectiva
É bem conhecido o grito da Revolução Americana no séc. XVIII: “No Taxation without Representation” – “Tributação sem Representação, não!” Esta poderosa reclamação de consciência popular conduziu, historicamente, à independência das colónias britânicas na América do Norte, declarada em 1776 e reconhecida em 1783, que deu origem aos Estados Unidos da América. É uma ideia de enorme poder. A indignação, primeiro, e a revolta, depois, dos colonos americanos por agravamentos tributários lançados pela Câmara dos Comuns, onde não tinham representação, desencadeou a cascata de acontecimentos que, em poucos anos, desembocou na separação e formação da nação mais poderosa do mundo.

Esta ideia soberana veio a tornar-se um emblema geral do parlamentarismo em todo o mundo democrático: uma das funções mais nobres dos parlamentos é assegurar a legitimidade de taxas e impostos lançados sobre os cidadãos e a sociedade. O instrumento principal é o Orçamento do Estado, isto é, a autorização de despesas e de receitas em que cada OE consiste. Todos os anos, o governo apresenta um determinado plano de despesas, cobrindo os diferentes sectores orgânicos e funcionais e as responsabilidades pendentes, para que pede autorização aos deputados; e submete simultaneamente ao parlamento uma determinada previsão de receitas, sobretudo tributárias, para cuja cobrança pede também autorização, a fim de cobrir e pagar as despesas. A legitimidade democrática decorre de serem os próprios cidadãos, contribuintes, através dos seus representantes, a autorizar o Estado a cobrar-lhes taxas e impostos para pagar as despesas públicas que também autorizam. Numa palavra, o regime é de Taxation with Representation – “Tributação com Representação, sim!”

Isto é a teoria. Na prática, quantos deputados estão conscientes do seu papel político não só como fiscais, mas efectivos lançadores dos impostos? Quantos deputados estão conscientes de que, quando soa a frase do cómico Jô Soares “Estão mexendo no meu bolso…”, o sujeito indefinido não é o ministro das Finanças nem o primeiro-ministro? Não, o sujeito são os deputados: os ministros só propõem, os deputados é que aprovam. Aprovam, decidem e ditam não só os impostos, nem só as despesas, mas toda a política financeira do Estado, tanto na teoria como na prática. Ditam e fiscalizam – ou melhor, devem fiscalizar.

Há dias, revi parte de um livro que está em preparação final e encerra um inovador trabalho de investigação de um jovem académico português na Universidade de Columbia nos Estados Unidos, André Corrêa d’Almeida. O livro é sobre a nossa política e a qualidade da governação democrática, se podemos sumariá-lo assim. Recolheu e digeriu centenas de contributos dos mais diversos sectores. Será certamente um livro importante.

No capítulo que pude ler, o autor recorda-nos um facto incontornável sobre o qual já tenho falado várias vezes. Outros também. Mas, pelos vistos, ainda não nos interpelou com a brutalidade necessária:  
[Desde 1976], em todo este período de mais de quatro décadas de gestão do Estado português, gastou-se sempre mais do que se produziu. O sistema político instaurado em 1976 foi até hoje incapaz de gerar, num ano apenas que fosse, mais receitas do que despesas. Isto é, o saldo orçamental em Portugal é sempre negativo. (…) Esta situação ocorreu continuadamente, mesmo nos períodos de crescimento continuado do produto interno bruto (PIB), não se tendo verificado poupança pública em períodos de crescimento económico.” (fim de citação)
Os números que mais nos atormentam o presente e o futuro colectivos são conhecidos: dívida pública um pouco acima dos 250 mil milhões de euros, correspondendo a cerca de 126% do PIB. O limite intransponível no quadro europeu era, recordemo-lo, de 60%, linha que ultrapassámos em 2004/05. Subimos para mais do dobro; e por lá temos andado. Como se chegou aqui? Por mais de 40 anos de défices consecutivos, não tem nada que enganar. Simplificando: a dívida é a soma dos défices; e os défices são os excessos da despesa sobre a receita – tão simples quanto isto. Somando os contínuos excessos de despesa anuais ao fio de mais de 40 anos seguidos, temos a dívida gigante que nos atormenta.
Quantos deputados se dão conta de que o seu papel crucial de representante do contribuinte se foi subvertendo, passando de sábio soberano da coisa pública a um frio e servil cobrador? Para mais, ordenando cobranças sempre insuficientes, pois a voracidade nunca parou e a dívida galgou em contínuo. Quantos deputados se dão conta de que a dívida, correspondendo a mais tributação no futuro, é uma forma de viver com os impostos de hoje mais já os de amanhã também? Quantos deputados se apercebem de que, nessa medida, estão a roubar parte do mandato e do poder dos seus sucessores?

Tudo isto é uma grande questão e uma conversa ainda maior. Mas, independentemente das visões políticas, o essencial é perceber que esta derrapagem financeira do Estado é a ruptura do sagrado princípio “no taxation without representation”. Porque a derrapagem aliena a liberdade da decisão, compromete o justo critério, põe os decisores a reboque, em vez de no comando – e empurra-nos para a ruína, como nos aconteceu.

É preciso restituir aos deputados o seu poder constitucional. É preciso os deputados reassumirem esse poder e não se deixarem ir na onda. Para que os cidadãos possam confiar outra vez. Hoje, deputado é gato por lebre: queremos um defensor e servem-nos um cobrador abúlico.

Precisamos de um sistema eleitoral em que os deputados, nos seus partidos, possam influenciar, de facto, e comandar as políticas, de acordo com o diálogo e os compromissos que vão estabelecendo com os cidadãos. Para que serve um “representante” que não representa? Para que serve um “representante” que, embrulhado e aperreado num novelo grupal, serve mais o poder dos de cima e nada o poder dos de baixo? Para que hão-de eleger os de baixo quem, quando chega a hora, não os representa?

A quem vamos recorrer para pouparem o nosso dinheiro? Falo quer do dinheiro nosso com que devemos ficar (porque nos faz falta na nossa vida ou para nossa poupança), quer do dinheiro nosso que pagamos ao Estado (e que este deve gerir com parcimónia e poupar, por respeito por nós). As finanças públicas não podem ser um assalto em contínuo ao bolso dos cidadãos.

A reforma do sistema político por que trabalhamos na SEDES e na APDQ, a favor da representação proporcional personalizada, é para um parlamento mais responsável, mais sólido, mais consistente, mais representativo, mais próximo da cidadania.
Pode juntar-se a este movimento cívico, assinando e divulgando a petição pública “LEGISLAR O PODER DE OS CIDADÃOS ESCOLHEREM E ELEGEREM OS SEUS DEPUTADOS”, neste endereço electrónico: https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania 
José RIBEIRO E CASTRO
Advogado
Subscritor do Manifesto "Por uma Democracia de Qualidade"
NOTA: artigo publicado no jornal i